29.10.14

In Facebook’s Courtroom



Por outro lado, há na cultura da internet uma tendência crescente à indig­na­ção como fim em si mesmo. Nos últimos anos a contínua exibição de revolta, jul­ga­mento e punição pela internet tem sido elemento ines­ca­pá­vel da vida con­tem­po­râ­nea. Car­re­ga­mos todos no bolso um cir­cuns­pecto, hiper­crí­tico, oni­pre­sente, inces­sante e impre­vi­sí­vel sistema judi­ciá­rio. Você pega o celular e começa a sessão do tribunal; coloca no bolso e ele entra em recesso.
. . . Com o tempo a utópica buro­cra­cia social do Facebook passou a ser inundada por uma dinâmica kafkiana de punição. O Facebook tornou-se um reduto perfeito para o jul­ga­mento – um lugar em que gente que você talvez conheça do modo mais casual se revela repen­ti­na­mente inte­grante de um sistema orga­ni­zado de dis­ci­pli­na­mento e dis­ci­plina. O site é um agregador de acusações, e a timeline é a pauta – cheia de opor­tu­ni­da­des para você publi­ca­mente admirar o certo e publi­ca­mente criticar o errado, julgar os outros pelos seus erros ou ser julgado por fazer o seu jul­ga­mento de modo errado.
. . . Mesmo postagens que parecem super­fi­ci­al­mente inócuas podem ter um aspecto de audiência pública e de inquérito legal. As populares “correntes” (uma versão recente, a “corrente de gratidão”, pede que você poste por cinco dias três coisas pelas quais se sente grato) são tipi­ca­mente kafkianas: debaixo do verniz de posi­ti­vi­dade tratam-se de punição pura e simples, acusações de ingra­ti­dão das quais se requer que você prove a sua inocência.
. . . Se o Facebook repre­senta um mundo descortês e kafkiano de jul­ga­mento inces­sante, por que gastamos tanto tempo nesse mundo? Por que nos mostramos tão dispostos a assumir as iden­ti­da­des de cri­mi­no­sos e pro­mo­to­res públicos, juízes e advogados de defesa, pri­si­o­nei­ros e algozes? Kafka acre­di­tava que todos ansiamos pela absol­vi­ção: queremos ser decla­ra­dos inocentes dos crimes que vemos ao nosso redor. Porém a inocência é um status difícil de se obter. Na vida diária é com difi­cul­dade que lutamos para fazer algo de realmente bom, às vezes até mesmo para deter­mi­nar o que é melhor. Em O tribunal, Josef K. faz o que pode para defender-se diante dos juízes muito humanos que o estão julgando. Mas o ver­da­deiro poder, um homem diz a ele – o poder de absolver – “reside somente na suprema corte, que é total­mente ina­ces­sí­vel para você, para mim e para todos os demais. Não sabemos como são as coisas lá em cima e na verdade não queremos saber”. Estamos con­fi­na­dos, para resumir, aos tribunais infe­ri­o­res, onde não temos escolha além de alegar a nossa inocência e esperar pelo melhor.

By http://www.newyorker.com/books/joshua-rothman/facebooks-courtroom